Placas enterradas por volta do ano 421 d.C. contendo registros antiguíssimos, que só deveriam ser revelados em tempo oportuno; mais de mil anos depois, a aparição de um espírito a um jovem camponês revelando o lugar onde as placas permaneceram durante tanto tempo; a tradução milagrosa das placas por um jovem semianalfabeto de uma língua estranha para o inglês: tudo isso, diriam, é o esboço de uma ficção mal pensada se, antes, não fosse pregada como a origem de uma religião que deveria nos guardar no Final dos Tempos.
Narra-nos Joseph Smith, o vidente e fundador da Igreja dos Santos dos Últimos Dias, ou dos Mórmons, que, quando jovem, presenciando algumas controvérsias entre as religiões vigentes à época, sentiu, em seu coração, após ler uma passagem das Escrituras, o desejo de pedir a Deus que o indicasse a qual deveria ele filiar-se. O ano era por volta de 1819, quando tinha 14 anos. Vemos menção aos batistas, aos metodistas e aos presbiterianos, e alguns membros de sua família faziam parte desses últimos. O jovem, inspirado pelas palavras que havia lido, recolhe-se a um bosque para orar. É aí que começa o relato das visões, e elas dividem-se em três. Recolhendo-se, então, em oração, a Primeira Visão é um espécie de chamado profético, onde lhe aparece Deus Pai e Jesus, dizem-lhe que não se juntasse a nenhuma daquelas falsas religiões da época — ele seria o fundador da verdadeira religião! Relata-nos que, alguns anos mais tarde, após ter sofrido muitas perseguições por causa de sua Primeira Visão, aparece-lhe um segundo espírito, dessa vez não Deus Pai ou Jesus, senão de um outro espírito, que o aparece após ele recorrer novamente à oração. O espírito diz ser enviado de Deus e releva-lhe seu nome, Morôni. Fala-lhe também a respeito de certas placas contendo registros antigos, enterradas com instrumentos mágicos que o ajudaria na tradução, das quais ele teve a visão donde estavam tão logo o espírito lhe falara. Após essa Segunda Visão, o jovem procura retornar sua vida normalmente, mas uma fraqueza corporal lhe acomete, fazendo-lhe ter de se recolher até uma Terceira Visão, na qual é pedido que ele as revele a seu pai.
Até aqui, nada muito incomum a todos aqueles que pretenderam negar a veracidade da Igreja Católica e fundar, sob a autoridade de uma suposta revelação divina, uma nova religião. Inclusive, um relato muito semelhante a esse que vimos, é o de Joaquim de Fiore, um monge do século XII que, após uma experiência privada, “anunciava o fim da Lei de Cristo, que deveria se retirar no ano de 1260 diante da Lei do Espírito. A terceira era será do Evangelho Eterno; a Lei do Amor e o tempo da Liberdade”, como nos diz Étienne Couvert ( A Gnose Contra a Fé, 2025). Mas essa semelhança ficará ainda mais evidente. Com efeito, Smith devia, a um só tempo, fundar uma religião e rechaçar qualquer outra; mas sendo a verdade uma só, e a mentira, múltipla, ele não fundava senão mais um outra falsidade contra a única e verdadeira religião católica. E ele estava só no começo! Tendo tido essas visões, Smith recebeu a ordem de ir ao local onde as placas permaneciam enterradas, e ali voltar frequentemente, até que se lhe ordenasse ,enfim, desenterrá-las. Permanecia neste local o mensageiro das visões anteriores, que lhe dava instruções a respeito do que deveria fazer. Após algum tempo, Smith recebe as placas e os instrumentos para sua tradução, que deveriam ser por ele mantidos em proteção até que o mensageiro Morôni as reclamasse. Durante esse tempo, Smith deveria copiar os caracteres da placa e traduzi-los. Por causa da popularidade que obtivera devido aos relatos das visões e a posse das placas, Smith recebe em sua casa um homem desconhecido, que se oferece para ajudar na tradução dos caracteres. Em certo dia, enquanto ainda trabalhavam na tradução, foram ter com Deus a respeito do batismo, ao que Deus supostamente lhes relevou um certo “Sacerdócio Aarônico”, e mandando-lhes que se batizassem mutuamente. Transcrevo o relato:
“Assim que saímos da água, após termos sido batizados, recebemos grandes e gloriosas bênçãos de nosso Pai Celestial. Apenas terminei de batizar Oliver Cowdery, o Espírito Santo desceu sobre ele e ele, pondo-se de pé, profetizou muitas coisas que logo deveriam acontecer. E tão logo fui batizado por ele, também recebi o espírito de profecia e profetizei sobre a edificação desta Igreja e muitas outras coisas ligadas à Igreja e a esta geração dos filhos dos homens. Estávamos cheios do Espírito Santo e regozijamo-nos no Deus de nossa salvação”.
E ainda, sobre a tradução do livro, o relato do ajudante de Smith:
“Esses foram dias inolvidáveis — ouvir o som de uma voz ditada pela inspiração do céu despertou neste peito uma profunda gratidão! Dia após dia continuei ininterruptamente a escrever o que lhe saía da boca, enquanto ele traduzia a história ou relato chamado ‘O Livro de Mórmon’ com o Urim e Tumim [ou seja, os instrumentos para a tradução], ou, como teriam dito os nefitas, ‘Intérpretes’.
Enfim! Aborrece-me ter de enumerar tantas coisas que não passam de pura invensão! Após a tradução das placas para o inglês, elas foram devolvidas, dizem, ao mensageiro Morôni que, conforme o livro traduzido, foi filho de Mórmon, o autor do livro original, e hoje não se pode tê-lo.
Nem preciso dizer que o livro e outros escritos de Smith contém uma série de erros a respeito da criação do mundo, do destino dos homens e da segunda vinda de Nosso Senhor, que estou juntando e, se Deus me permitir, postarei em breve. Dizem que Deus está no Sol, na Lua e nas luzes das estrelas; dizem que os astros são reinos e, se alguém os viu, viu Deus. Um erro gravíssimo que identifica Deus com o mundo! Mas é claro que tudo isso é fruto de um ódio à verdadeira Igreja Católica, a única fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo, a quem chamam de “a grande igreja, a mãe das abominações” que “persegue os santos de Deus”:
E aconteceu que vi entre as nações dos gentios a formação de uma grande igreja.
E disse-me o anjo: Vê a formação de uma igreja que é a mais abominável de todas as igrejas, que mata os santos de Deus, sim, tortura-os e oprime-os e subjuga-os com um jugo de ferro e leva-os ao cativeiro. (livro de Mórmon, 1 Néfi, 13:4-5)
E mais adiante:
E falou-me o anjo, dizendo: Eis que o ouro e a prata e as sedas e as escarlatas e o linho finamente tecido e as vestimentas preciosas e as meretrizes são os desejos dessa grande e abominável igreja. (Livro de Mórmon, 1 Néfi 13:8)
No fundo, querem dizer: a Igreja é mui severa, subjuga os “santos” com julgo de ferro; façamos, pois, à nossa maneira, e fundemos uma nova Igreja conforme nos apraz!
Salve Maria!
Por: Antonino Moralis